segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Expô: Náusea, de José Rufino

Matéria publicada no Jornal A União

Calina Bispo
Repórter
20.01.08

Segue até 23 de fevereiro no Centro Cultural Banco do Nordeste em Sousa, a exposição “Náusea”, assinada pelo artista plástico José Rufino, sob curadoria de Marcelo Campos, que é doutor em Artes Visuais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro- UFRJ; e Professor Adjunto e Coordenador da Graduação em Artes do Instituto de Artes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ. A entrada é gratuita.
Segundo o curador, “para se observar o trabalho do artista, a curadoria traz à tona o romance A Náusea, de Jean Paul Sartre, no qual o protagonista acredita que os objetos o tocam, colocando-nos enquanto espectadores, observando mobiliários que apresentam uma certa estranheza”.
Essa nova instalação de Rufino é formada por uma mistura de móveis de aço, como escrivaninhas, arquivos de fichas, arquivos de pastas suspensas e armários de cujas gavetas “escorrem” gravuras simétricas à maneira das manchas psicanalíticas de Hermann Rorschach.
“Os móveis de metal característicos de ambientes regulares como repartições e instituições públicas perdem sua regularidade. A grandiosidade da obra de Rufino reside em não aceitar as manobras óbvias e regulares. Os armários são sucateados, das gavetas surgem papéis manchados, os desenhos são feitos sobre documentos originais”, observa o curador em seu texto de apresentação da exposição.
O curador segue explicando como referências literárias e questionamentos pessoais estão juntos e intrinsecamente ligados nas obras de Rufino e de forma bastante expressiva. "Os objetos não deveriam nos tocar, já que não vivem. Utilizamo-los, colocamo-los em seus lugares, vivemos no meio deles: são úteis e nada mais. E a mim eles tocam – é insuportável. A constatação do protagonista de A Náusea, romance de Jean Paul Sartre, serve-nos com justeza para observação sobre o trabalho de José Rufino. Seus objetos nos colocam, enquanto espectadores, à espreita, observando mobiliários que apresentam uma certa estranheza. Também como na estratégia dos textos de Kafka, Rufino atua com olhar insistente sobre as coisas até torná-las tocantes, instigantes, estranhas a ponto de dialogar conosco como um corpo subjetificado, vivo e pulsante. Assim acontece com gavetas, escrivaninhas, fichários, arquivos. Ao agrupá-los, forma-se um aglomerado com arestas, pontas, lacunas, aberturas, vãos”, enfatiza Campos.
Desta forma vê-se que a náusea é uma consciência subjetiva. “Os armários cospem desenhos, manchas, fluidos. Rufino retoma o gesto expressivo de trabalhos anteriores. Agora, a expressividade vem como apropriação de rabiscos estranhos, estrangeiros, já encarnados nos armários como espectros. Manchas e desenhos se lançam da escuridão das gavetas - por intermédio de imagens fluidificadas - em busca do outro, do grito, do expurgo”, conclui.

Saiba Mais sobre José Rufino

O artista vive e trabalha no Brasil. É doutor em Geologia e iniciado, através de cursos livres. Desenvolveu sua jornada artística passando da poesia para a poesia-visual e em seguida arte-postal e desenhos nos anos 80. Um de seus primeiros temas transformados em artes dói o universo do declínio das plantações de cana-de-açúcar no Brasil em desenhos (longas séries em envelopes e cartas) e instalações (Respiratio, Sudoratio, Vociferatio, Lacrymatio) com mobiliário e documentos de família e institucionais.
Rufino também é muito conhecido pelos seus impressionantes trabalhos de caráter político, como a grande instalação Plasmatio, primeiramente exibida na XXV Bienal Internacional de São Paulo (2000), e composta por mobiliário e grandes manchas de tinta à maneira das pranchas psicanalíticas de Hermann Rorschach, sobre cartas e documentos originais de desaparecidos políticos brasileiros.
O diálogo dicotômico entre memória e esquecimento contamina seu trabalho completo. Instalações complexas têm sido elaboradas a partir de contextos institucionais, como portos (Laceratio) e estradas de ferro (Murmuratio). A última, um grande “depósito de detritos de inundação fluvial” de mesas, escrivaninhas e cadeiras com raízes, “exumadas” (Léthe, 2006), sintetiza seu procedimento. Fez exibições em bienais (Havana, 1997; São Paulo, 2000; Mercosul, 1999; Venezuela, 1998, 2004; Ushuaia, 2007) e grandes exposições individuais (Museu de Arte Moderna, Recife; 2003; Museu Oscar Niemeyer, Curitiba; 2004; Museu de Arte Contemporânea, Niterói; 2004; Embaixada do Brasil, Berlim, 2006).

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